Sobre o texto anterior, recebi (de forma privada) duas respostas – como posso dizer…? – interessantes.
“Pronto Sirelli, já pode votar no PT. Foi de Ciro só pra disfarçar”.
“Mas os erros do PT só começaram a aparecer depois de 2004”.
Desde a minha primeira eleição, votei no PT. Especialmente, claro, no Lula. Até 2002. Mais que isso, era militante mesmo, de andar com estrela no peito, de vender materiais pra ajudar a arrecadar etc. Até 2002. Por quê?
Porque depois de dois anos de governo, já havia o cadáver de Celso Daniel, já conhecíamos Waldomiro Diniz e, na preparação para as eleições de 2004, abriu o leque de alianças que deu no que deu. O cheiro do ralo já estava instalado.
Sim, os “erros” do PT só apareceram depois de 2004 se falarmos do mensalão e tudo o que soubemos depois. O que, convenhamos, não foram “erros”. Foi uma cagalhopança do tamanho do Brasil, pra dizer o mínimo. E sim, meteram a mão. Como “nunca antes na história destepaiz”. Depois de passarem décadas dizendo que tudo estava errado e fariam exatamente o contrário.
E, por enquanto, nem vou entrar no mérito do perfil hegemônico que assumiu, da busca incessante pelo poder a qualquer custo, das sabotagens a qualquer um que não se aliasse, entre muitas outras coisas.
Então, como já disse um dia, é bem fácil explicar o ódio ao PT: nós fomos muito enganados.
E como podem ver, sei muito bem do que se trata o PT. “Ah, mas eles fizeram isso e aquilo…”. Pois é, todo governo faz alguma coisa boa. Eles fizeram algumas mesmo. Mas não compensa, não justifica, aquele chavão de fins e meios…
E não, não disfarcei nada. Das opções dadas, acredito que a melhor era o Ciro, apesar da Kátia Abreu. Mas gostaria mesmo é de ter votado no Eduardo Jorge.
Mas, então, por que cargas d’água vou votar em Haddad? Porque a alternativa a ele é inimaginável na minha consciência. Por tudo o que escrevi no texto anterior e muito mais.
Porque, se necessário, contra o PT, o país consegue lidar por meio de suas instituições e leis. Mesmo que aos trancos.
E, basicamente, porque tendo estudado um bom bocado de história, tenho a percepção de que nossa frágil democracia está em risco com o outro candidato. E não pelo que vai acontecer, mas pelo que já está acontecendo. E não dá pra achar normal.
“Se acha que os dois são ruins, anula o voto!”
Não! Porque lavar as mãos não resolve nada. Lavar as mãos não absolve minha consciência. Porque entendo que anular o voto é dizer “fodam-se vocês aí” enquanto eu faço parte, para o bem e para o mal, de tudo o que venha a acontecer a partir de 29 de outubro.
Porque se eu anular o voto com o espírito “vocês que arrumaram essa confusão que a resolvam”, um dos dois será eleito da mesma forma e eu vou sofrer as consequências do mesmo jeito.
Não é só porque eu e você votamos no Ciro, Amoedo, Marina, Alkmin, Boulos, Daciolo ou Eymael que não fazemos parte do problema em que estamos.
E se eu ligar o foda-se, não vou poder olhar para minha amiga gay e tentar consolá-la depois de sofrer uma violência. Se eu ligar o foda-se, não poder olhar para minha colega de trabalho negra e tentar consolá-la depois de sofrer uma violência. Se eu ligar o foda-se, não vou poder tentar ajudar a vizinha que deixou de ser contratada ou foi demitida por ser mulher e poder engravidar. Porque se eu ligar o foda-se, não vou poder olhar nos olhos da professora das minhas filhas que perdeu o seu filho (negro) quando o policial “confundir” um guarda-chuva com um fuzil.
Porque se eu ligar o foda-se, não vou poder viver com vocês. Nem vou poder reclamar quando vocês ligarem o mesmo foda-se para mim.