Pensar dá trabalho. A turma foi para a rua gritar e gritar e gritar. Não, não acho isso ruim não, muito pelo contrário. Mas tem muita gente que não faz ideia do que está fazendo. Uma pesquisa (não lembro agora se foi do DataFolha) mostrou que cerca de 70% das pessoas que protestavam na Paulista não sabia do que se tratava a tal PEC 37. Muita gente, inclusive, segurando cartaz contra ela.
Agora, olhem bem para essa imagem aí em cima. É uma lista de reivindicações entregue por seis pessoas que estavam entre os manifestantes de Brasília à Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados. Depois, foram recebidos pelo diretor-geral da Câmara que prometeu levar os pedidos aos deputados.
Antes de falar da lista, propriamente dita, há um detalhe besta, sem nenhum significado, nela: “Ass: povo brasileiro”. Oi? Se os caras não representam nem o povo de Brasília, como é que eles me incluíram nessa? Ou será que não faço parte do “povo brasileiro”?
Agora, vamos a lista:
1.Não a PEC 37/33
Isso é grave. A PEC 33 quer submeter decisões do STF ao Congresso, enquanto a 37 quer limitar o poder de investigação do Ministério Público.Golpe de estado branco. E a pergunta que não quer calar: a quem interessa essas duas propostas?
2.Fim do voto secreto
Mais um ok. Afinal, parte-se do princípio que, sem poder se esconder, o sujeito – vereadores, deputados e senadores – ficariam minimamente constrangidos em tomar decisões contra os interesses da população. E quem bancasse, teria de prestar contas de suas escolhas pelo menos na próxima eleição. E não é lá muito boa ideia confiar na memória ruim da população em tempos de internet.
3 e 11. Investimento na saúde, educação e segurança, e melhorias no transporte público
Legal, afinal quem é que não quer isso. O problema é a falta de controle nos investimentos dessas áreas. Como são problemas crônicos, não há nenhuma medida prática que resolva coisas de um dia pro outro. Assim, teríamos de cobrar programas estruturados para cada tema e conseguir (e aqui é que está o problema) controlar todos os gastos e promessas. E hoje não vejo mecanismos para isso. Alguém aí tem alguma sugestão?
4.CPI da Copa
Nem daria tanto trabalho, é só pensar um pouquinho e fazer algumas contas pra saber para os bolsos de quem foi o dinheiro. Talvez seja um tantinho difícil provar um tantinho ou outro, mas vale a pena. No entanto, principalmente depois da interdição do Engenhão, com todo o dinheiro que foi gasto, qual é qualidade real dessas obras? O CREA poderia emitir pareceres a respeito? O mestre de obras de cada um dos estádios tem coragem de levar a família em dia de clássico? Meu medo é a bancada da bola e o corporativismo em geral permitirem que se chegue a alguma resposta prática. Ou alguém ainda lembra do que não aconteceu apesar de todas as conclusões da CPI da CBF?
5.Retirada de Renan Calheiros da presidência (do Senado)
Infelizmente, ele só sai se quiser, se renunciar, ou se perder o mandato. Porque foi eleito segundo as regras vigentes. Qualquer outra forma configuraria golpe. Simples assim.
6.Estado laico efetivo
Aqui, as discussões começam a ficar tortas e a discordância de opiniões chega a parecer um crime.
É claro que as decisões de estado não podem ser tomadas com base em quereres, pensamentos, profecias e dogmas religiosos. Mas é preciso não esquecer que o Brasil é um país religioso. Isso significa que o valores de grande parte da população (e isso vale pra nós e nossos digníssimos representantes) são fortemente construídos sobre valores e doutrinas religiosas.
Também é preciso lembrar que como qualquer grupo de pessoas, religiosos também têm o direito de eleger seus representantes. E como tal, têm o direito de defender suas causas. Com o devido respeito, é preciso concordar ou discordar em argumentos e não como rolos compressores, sem denegrir ou diminuir imagens e reputações. Nem Maluf, nem Collor, nem Feliciano, nem Chico Alencar me representam. Mas foram todos eleitos e devem ser respeitados.
7.Cassação e prisão dos mensaleiros
Infelizmente, nada disso depende dos nobres deputados. É uma questão legal, o processo está correndo e cedo ou tarde chegará a termo. No tempo certo ou ideal? Sabemos que não, mas já deixou há muito de ser um problema político.
A grita deveria ser contra o governo e seus líderes, além da oposição ridícula que existe hoje, pela indicação de Genoíno e João Paulo para a Comissão de Constituição e Justiça.
A outra grita deveria ser contra os dois últimos indicados para o STF, que chegam a tempo de melar as condenações e rever penas para que os amigos do rei não puxem cana. Barroso, o último, já declarou em entrevista que o Tribunal foi muito duro no julgamento. Abram os olhos, já há um rodízio de pizzas inteirinho no forno.
8.Corrupção como crime hediondo
Taí uma oportunidade de agir com as próprias mãos. Alguém realmente acredita que o Congresso tomará essa decisão por iniciativa própria? O caminho para isso se tornar real é conseguir, primeiro, aprovar o fim do voto secreto; depois, uma proposta popular como aconteceu com a Ficha Limpa.
9.Fim do foro privilegiado
Já falei disso por aí. Há uma percepção errada sobre o tema, por conta do termo ‘privilegiado’. O termo correto é Foro por Prerrogativa de Função.
Tentar acabar com isso seria uma baita estupidez.
Sem esse mecanismo, processos contra políticos e afins se arrastariam por todas as instâncias, pois essa turma tem grana para bons advogados. Se um dia, depois de recursos e protelações infindáveis, um processo chegar ao STF, o crime já estaria prescrito.
10.Veto ao ato médico
Quem foi que disse que o médico é um Deus e que os outros profissionais da área de saúde (nutricionistas, fisioterapeutas, psicólogos, enfermeiros e quetais) não têm competência para tomar decisões em suas áreas específicas?
12.Redução salarial dos parlamentares
Sejamos práticos: conseguir um congelamento já seria uma vitória e tanto. Não se esqueçam que quem vota os salários dos parlamentares são os próprios parlamentares.
Com muita sorte, talvez um dia e depois de muita briga, seria possível conseguir um acordo nacional de redução dos salários de parlamentares e chefes de executivo em todas as esferas em 10 ou 15%. Mas sinceramente, acho que mais fácil chegar aos 150 anos de idade do que ver isso acontecer.
13.Voto não obrigatório
Essa é factível e seria excelente. Mas também vai requerer muita briga. Porque o fim do voto obrigatório levaria ao cabo, em algum tempo, o voto de cabresto que todos sabemos existir apesar de ilegal.
Sem mais por hora, boa sorte pra todos nós.