Hora da escola

O texto abaixo foi publicado originalmente no dia 20 de novembro de 2010. Mas até hoje ele é disparado o post mais visitado, mas lido e comentado do blog, com mais de 5 mil visitantes únicos. E é por isso que resolvi republicá-lo, não por acaso na época de busca por escolas, de matrículas e rematrículas.

Na época procurávamos a primeira escola da Helena. Hoje, ela e Isabel seguem felizes suas vidas escolares. E é bem fácil deduzir que a Oga Mitá foi a escolhida.

Esse texto tem quatro filhotes e vocês podem encontrar todos eles clicando aqui e espero que sejam todos úteis.

E aos que decidirem visitar a escola, tenham a certeza que – além de serem muito bem recebidos – vão se surpreender. Basta estarem dispostos. E não esqueçam de dizer como chegaram à escola, que foi uma indicação do Gustavo, pai da Helena e da Isabel. A casa agradece de joelhos  ;).

Sabe aquela frase sobre o futuro de nossas crianças que já virou clichê: “não importa que mundo vamos deixar para nossas crianças, mas que crianças vamos deixar para o mundo”. Pois é, foi uma semana bem interessante essa que passou. Já peço desculpas antecipadas pelo texto longo que escrevi, mas achei que dividir essas experiências seria importante.

Já há alguns meses desde que a Mari começou a visitar escolas próximas de casa em busca de um bom lugar em que Helena comece sua vida acadêmica. E nesta semana fizemos um pequeno roteiro juntos. Como estou muito longe de ser um especialista em educação, minhas impressões refletem – simplesmente – o que percebi como pai em função do que gostaria para minha filha.

Construção

Foram cinco visitas nos últimos dias, teremos mais uma na segunda-feira. E em cada uma delas, olhos e ouvidos atentos às qualidades e defeitos. Como quando o ano letivo começar, em fevereiro, ela terá um ano e quatro meses, além de entender como é o processo pedagógico de cada uma, muita atenção às pessoas que possivelmente lidarão com nossa menina e com a estrutura oferecida, instalações etc.

A primeira visita foi à Oga Mitá. E algumas coisas interessantes chamaram muito a atenção. O primeiro ambiente, logo após passarmos o portão, é a biblioteca. A partir daí, não deveria ter sido surpresa encontrar, no sofá próximo à secretaria, uma menina confortavelmente instalada e concentrada no livro em suas mãos. Em horário de aula! Ao mesmo tempo, na pequena quadra, meia dúzia de quatro ou cinco crianças jogavam bola. A essa altura, Helena já andava pra lá e pra cá. E quando fomos fazer a visita propriamente dita e conversar com a coordenadora, ela já tinha se enturmado com as crianças de sua idade e ficou junto com a turma. Hummm…, foi o que pensei.

A linha de atuação da escola é baseada no construtivismo, o que – entre muitas outras coisas – incentiva a autonomia das crianças.

Hummm, continuei ruminando, quer dizer que é possível incentivar minha filha a pensar para que serve a tabuada ao invés de simplesmente fazê-la decorar que 7 X 9 = 63? É possível, mais do que ensinar, incentivar minha filha a decidir o que é certo para ela? Hummm…

Muitas questões

A segunda visita foi à Meimei, outra escola muito bem conceituada e que, em tese, também segue uma linha progressista. Fomos muito bem recebidos por todos e Helena, rapidamente, já estava mais uma vez entre as crianças. A estrutura da escola é bem legal, todas as pessoas muito simpáticas e tal, crianças nitidamente muito bem educadas, mas sabe aquela sensação de que algo não bate?

O que me incomodou foi um certo artificialismo, presente principalmente no discurso da coordenadora que nos recebeu. É que para ela tudo era uma questão. A questão do leve e pesado, do doce e salgado, do quente e do frio etc etc etc. Eram tantas questões e nenhuma resposta que fiquei ensimesmado. Alguém poderia dizer que o problema, então, não era a escola mas aquela pessoa. Mas, como lembrou a Mari, quem colocou aquela moça ali?

Três sapos

A sexta-feira foi bem movimentada, com visitas a três escolas. A primeira foi à J’Alevi. Mari já tinha visitado essa antes e, de certa forma, gostado. Na verdade, uma pequena escolinha tradicional, onde tudo funciona bem, profissionais simpáticos, crianças sorridentes e bem educadas. E bem perto de casa, pra ir andando. Mas aí, quem implicou fui eu. Um sobradinho acanhado, onde tudo é apertadinho e cheio de escadas. Pra mim, coisas que não combinam com crianças.

Logo depois, andamos mais 50 metros e chegamos à Sindicato da Criança. Fomos muito bem recebidos por uma das sócias da escola. A visita não ia mal não, muito pelo contrário, estava gostando mesmo do que via. Tudo muito simples, mas tudo bem feito e resolvido, até que entramos em uma sala e… “Haviam (sic) três sapos”.

A frase estava lá na parede, em um quadro em que as crianças, aparentemente, estavam aprendendo as primeiras noções de matemática. Depois dessa, precisa dizer mais alguma coisa?

Grande empresa

A última visita foi ao Mopi. É bem possível que, lá em 1973, quando a professora Regina Canedo fundou a escola, sua proposta fosse realmente brilhante. E se é inegável que a escola é conceituadíssima e acumula muitos bons resultados em sua história, minha impressão é de que – em algum momento de seus 37 anos – algo saiu dos trilhos.

Tudo é superlativo, o gigantismo é característica que grita aos olhos de quem circula pela escola. À primeira vista, a estrutura é sensacional e apesar de ser uma “escola vertical”, há espaço pra tudo. Mas como em tudo o que é grande demais, é nítida a impessoalidade no lidar com as pessoas. Sabe a diferença entre viajar e ficar numa pousada ou no Hilton? Foi o que senti.

Listo alguns detalhes que chamaram nossa atenção, infelizmente, sempre negativamente. Das escolas que visitamos juntos, foi a única em que Helena não conseguiu interagir com outras crianças. Foi a única em que vimos crianças correndo pelos corredores estabanadamente, esbarrando nos outros e sequer se preocupando em olhar pra trás para ver se estava tudo bem (pedir desculpas, então, nem pensar). Foi a única em que, antes mesmo de avaliar o desenvolvimento de Helena, já fomos avisados que ela teria que repetir a série (maternal 1 ou algo assim) em função de sua idade (porque ela teria 1 ano e quatro meses e o certo seria um ano e seis). Não fomos apresentados e não vi biblioteca, simplesmente não sei se existe. Funciona como uma grande corporação, terceirizando serviços como a alimentação, aulas de laboratório de ciências, aulas de inglês e sei lá mais o quê. É a única que em todas as suas salas há instalado um quadro board (primeira vez que vi uma redundância bilíngüe), usando a tecnologia como grande bandeira mas esquecendo que ela deve ser ferramenta ao invés de princípio.

Por fim, além de não encontrar qualquer coisa positiva, ainda é a escola mais cara.

O que queremos?

Nos recusamos a participar da neurose que tem tomado conta de muitos e muitos pais de nossa geração e escolher a escola em que Helena entrará com menos de um ano e meio imaginando em como isso se refletirá em sua colocação no vestibular. Também não queremos uma grife.

Em compensação, fazemos questão de um ambiente que seja agradável a ela, em que ela se divirta e aprenda de maneira natural, em que seja tratada como gente e não como a criança número 9 da lista de chamada.

Ainda lembro de uma troca de cartas entre meu pai e uma professora de português na minha quinta série, sobre uma questão de prova. Não acho que esse distanciamento funcione, não quero passar por algo parecido. Procuramos uma escola à qual tenhamos acesso, em que participemos ativamente do processo de educação de nossa moça, como parceiros que devemos ser, ao invés de entregá-la e buscá-la nas horas marcadas e vocês que se virem.

Ainda não tomamos qualquer decisão, ainda há outras escolas para visitar e algum tempo para pensar. Mas, como vocês podem ver, eliminar opções tem sido bem fácil.

Distorções

Sinceramente, não sei o que significa meus 37 anos frente à expressão “estou ficando velho”. Não sei o quanto relativo pode ser seu uso. Mas o fato é que sou do tempo em que se conquistava bolsas de estudo por méritos. Coisas do tipo, os três ou cinco ou dez primeiros colocados no vestibular. Talvez, se aplicados aos dias de hoje, os tantos primeiros no Enem.

Mas aí, um dia, o governo criou o ProUni. E está lá no site do Ministério da Educação:

O Programa Universidade para Todos (ProUni) foi criado em 2004, pela Lei nº 11.096/2005, e tem como finalidade a concessão de bolsas de estudos integrais e parciais a estudantes de cursos de graduação e de cursos sequenciais de formação específica, em instituições privadas de educação superior. As instituições que aderem ao programa recebem isenção de tributos.

Não seria excelente se o Brasil distribuísse bolsas de estudo a estudantes que merecessem o benefício e com o objetivo de fomentar a pesquisa? Pois é, e aí está a primeira distorção do negócio. Porque o critério não é qualidade do estudante, mas sua renda familiar. Também está lá no portal do MEC que as bolsas integrais são para os estudantes com renda familiar (por pessoa) de até um salário mínimo e meio. As bolsas parciais, de 50%, são para aqueles que possuam renda de até três salários mínimos.

E alguém dirá que esses critérios são aplicados em concomitância às notas do Enem. Mas não lembram que se a verba é para 10 bolsas (por exemplo) e que, pelos critérios de renda, os dez beneficiados forem os últimos colocados eles receberão a bolsa da mesma maneira.

Ah, tem mais um filtro. O aluno tem que ter cursado o ensino médio em escola pública ou já ser bolsista em escola privada. Mas ninguém fala nada sobre investir de verdade na escola pública para que os estudantes estejam realmente preparados para competir pelas bolsas baseados apenas em seus méritos. E, só pra lembrar, quem paga por isso somos nós, todos nós que pagamos regiamente nossos impostos.

Mas pode piorar.

Como disse lá em cima, sou do tempo em que se conquistava bolsas de estudo por mérito. E, para mantê-las, era preciso continuar merecendo. Como não ser reprovado. Quando isso acontecia, o estudante perdia a bolsa de modo parcial ou integralmente – segundo os critérios dessa ou daquela instituição de ensino.

Pois não é que vejo a notícia – a segunda distorção – de que o bolsista do ProUni passa a ter o dobro do tempo formal do curso para se formar. Ou seja, se a faculdade é prevista para quatro anos, o cara pode levar oito. Só pra constar, antes era possível levar o curso em um prazo uma vez e meia maior que o previsto (seis anos para um curso de quatro). Pombas, assim é mole!!!!

Lembro, mais uma vez, que quem paga por essa farra somos nós. E o resultado disso pode ser visto na qualidade dos profissionais que chegam ao mercado. Ou será que é por acaso que o número de reprovados cresce a cada prova da OAB? Ou será que é por acaso que recebo e-mails de engenheiros que, empregados na maior empresa do Brasil, escrevem preçinho com ‘ç’? Ou será que é por acaso que precisei consultar quatro médicos para que uma otite, algo básico, fosse diagnosticada na minha filha depois dos três primeiros chutarem a velha história da virose?

Como podem ver, o Brasil é mesmo o país do futuro. Dá pra imaginar qual.

Trezgumes

A cada semestre, a mesma rotina. E-mails que não acabam mais com respostas absurdas de alunos ou vestibulandos de todo o País. E sempre me perguntei se essas coisas são de verdade mesmo ou fruto das mentes doentias do sem número de humoristas e pretensos humoristas espalhados pela internet.

De qualquer maneira, artificial ou não, a maioria delas é divertida. Abaixo, algumas frases que teriam sido colhidas da prova de redação da UFMG pelo professor José Roberto Mathias. O tema foi ‘A TV forma, informa ou deforma?’ e, em tese, todos terminaram (Deus sabe como) o segundo grau.

– A TV possui um grau elevadíssimo de informações que nos enriquece de uma maneira pobre, pois se tornamos uns viciados deste veículo de comunicação.

– A TV no entanto é um consumo que devemos consumir para nossa formação, informação e deformação.

– A TV se estiver ligada pode formar uma série de imagens, já desligada não…

– A TV deforma não só os sofás por motivo da pessoa ficar bastante tempo intertida como também as vista.

– A televisão passa para as pessoas que a vida é um conto de fábulas e com isso fabrica muitas cabeças.

– Sempre ou quase sempre a TV está mais perto denosco, fazendo com que o telespectador solte o seu lado obscuro.

– A TV deforma a coluna, os músculos e o organismo em geral.

– A televisão é um meio de comunicação, audição e porque não dizer de locomoção.

– A TV é o oxigênio que forma nossas idéias.

– …por isso é que podemos dizer que esse meio de transporte é capaz de informar e deformar os homens.

– A TV ezerce poder, levando informações diárias e porque não dizer Horárias.

– E nós estamos nos diluindo a cada dia e não se pode dizer que a TV não tem nada a ver com isso.

– A televisão leva fatos a trilhares de pessoas.

– A TV acomoda aos tele inspectadores.

– A informação fornecida pela TV é pacífica de falhas.

– A televisão pode ser definida como uma faca de trezgumes. Ela tanto pode formar, como informar, como deformar.

Diante disso, levando-se em conta que todos os trechos acima são reais, me pergunto como é que estes vestibulandos passaram pelo primário?

Injustiça de César

Caros amigos,

Uma causa justa e muito urgente necessita do apoio da sociedade. Imaginem que o prefeito Cesar Maia proibiu o uso das escolas municipais pelos pré-vestibulares comunitários. Estes cursinhos de vestibular apoiados unicamente no trabalho voluntário e na organização autônoma das comunidades já funcionam há mais de 10 anos, e vem sendo responsáveis pelo ingresso de um número cada vez maior dos estudantes com menos recursos na universidade. Estes estudantes teriam muita dificuldade para o ingresso se dependessem de cursos pagos, ou seja, do acesso pelo mercado.

Esta forma de trabalho voluntário e comunitário tem sido uma das maiores vitórias da organização popular autônoma nos últimos anos. Assumindo o lugar do Estado que não tem capacidade de oferecer o nível de instrução necessária no Ensino Médio para que os alunos da escola pública possam ter chance no vestibular, estes cursos comunitários, com o trabalho voluntário de “professores”, vêm – ano após ano – aumentando o número de alunos da periferia que chegam lá, que entram no Ensino Superior vencendo a barreira do mercado e da exclusão. É emocionante, é uma vitória de cada um e da comunidade que tem uma expressão social muito importante.

Só para dar uma idéia, os “professores” são os ex-alunos destes mesmos cursinhos que hoje já estão na universidade. Isso sem contar com voluntários da classe média que se somam em número cada vez mais expressivo nesta forma de trabalho voluntário. E vem então o prefeito Cesar Maia colocar um obstáculo em tudo isso.

É repugnante, mas aqui não se trata diretamente de fazer política, mas de fazer JUSTIÇA. A petição para a qual se requer a sua assinatura foi sugerido pelo Ministério Público estadual, e está colocada em um site apropriado e seguro. Conto com apoio de todos vocês.

Abraços,
Alberto Schprejer

Clique aqui para o abaixo-assinado on-line.