Não tem tradução

Preciso contar uma coisa pra vocês: eu não frequento rooftops.

Tem muitos dias não, vi um texto do Millôr dando uma belíssima sacaneada naquele estrume do Aldo Rebelo, que um dia – lá pelos idos de 99, 2000 – apresentou um projeto de lei (que chegou até a ser aprovado na CCJ em 2007) limitando o uso de estrangeirismos.

Quero dizer que sou contra. Por muitos motivos, desde as discussões mais acadêmicas sobre a língua ser um organismo vivo até a liberdade de cada um fazer o que bem quiser com a língua que mais lhe aprouver.

Mas eu tenho o direito de achar isso, essas palavrinhas em inglês no meio de frases em português, um tanto cafona. Pra dizer o mínimo. Sempre imagino como seria a cena ao contrário, com alguém falando em inglês e, à toa, encaixando alguma coisa em português. Let’s talk about your trabalho and the ideias you’ve had.

E sim, trabalho com Comunicação e desde o primeiro período de faculdade fui obrigado a conviver com jobs e deadlines. Muito antes dos insights e quetais dominarem o vocabulário corporativo, imposição dos afetados paulistas que chegou ao Rio pela Barra da Tijuca, a filial de Miami (como podem ver, existe sim pecado do lado de baixo do Equador), e se espalhou tragicamente por nosso belo balneário.

E por que estou falando disso? Passou por mim no feed de uma dessas redes um vídeo de um rapaz com sotaque carioca apresentando o que seria o melhor rooftop do Rio de Janeiro. Pelo que entendi, fica em Ipanema, berço do Simpatia É Quase Amor que completa 40 anos em 24. Achei um assinte nada simpático. Também imaginei Albino Pinheiro, Ziraldo, Fredy Carneiro e Jaguar, em 1965, fundando a Banda de Ipanema no melhor espírito Let’s party!

E com o coração carioca de Vila Isabel aos pulos, só pensei em uma coisa: rooftop de c* é r*l@!!!!

Sei que isso aqui não passa de um desabafo e que nada vai mudar. E que toda essa afetação que só serve pra cobrar mais caro por qualquer coisa (alguém inventou que um rooftop vale mais do que uma laje ou um terraço porque é gringo. E quem acreditou, não sabe o que está perdendo) nem é novidade. Noel escreveu Não tem tradução em 1933.

Amor lá no morro é amor pra chuchu
As rimas do samba não são I love you
E esse negócio de alô, alô boy e alô Johnny
Só pode ser conversa de telefone.

Por aqui, apesar dos jobs, pitches e storytellings com que sou obrigado a lidar, não me rendo. Pelo menos até alguém me convencer que arrumou palavras melhores que cumbuca e borogodó.

Duvideodó!

Comente