Entre guitarras e motores

E aí, lembrei que hoje seria aniversário de George Harrison. E lembrei que o sujeito era um apaixonado por corridas de automóvel e costumava freqüentar a F1. Fã mesmo, daqueles de acompanhar o circo onde ele estivesse. Só pra se ter uma idéia, ele foi o primeiro beatle a vir ao Brasil, justamente por causa de um GP, em 1979.

Usei o GP como desculpa para ir ao Brasil, simplesmente porque eu nunca havia estado lá. Queria apenas ver como era e, quem sabe, passar alguns dias com Emerson Fittipaldi na praia.

Entrevista de Harrison à F1 Racing, em 1979

Dá pra imaginar, hoje em dia, um sujeito como George Harrison, mesmo que sem compromissos oficiais, aportar por aqui sem chamar muita atenção, só para ver uma corrida e pegar uns dias de praia? Pois é, os tempos mudam…

Enfim, naquele mesmo ano, Harrison lançou a música Faster como terceira faixa do disco George Harrison. Só que a música também foi, pouco tempo depois, lançada num compacto simples que hoje é peça de colecionador. Do lado A, Faster e um selo com fotos de grandes pilotos; do lado B, Your Love is Forever e a foto do lótus de Gunnar Nilsson em 1977, piloto sueco que morreu de câncer em 1978 (triste ironia, Harrison também morreu de câncer em 2001).

Além de ouvir a música, vale prestar atenção no vídeo abaixo, com grandes imagens de corridas, entre elas uma largada em Interlagos e uma Renault rasgando a enorme reta de Jacarepaguá. De quebra, o motorista de Harrison é ninguém menos que Jackie Stewart

Com a (merecida) idolatria a Paul e John, sempre achei que George teve sua importância no quarteto de Liverpool subdimensionada. Uma pena. Guitarrista e compositor como poucos na história.

 

Fórmula 171

Eu devia ter uns cinco ou seis anos quando ganhei um carro de fricção, preto com detalhes dourados, com duas asas. Provavelmente já sabia que aquilo era um Fórmula 1, o que não significa que entendesse o significado disso. Gostava do carro porque cruzava a sala de ponta a ponta, em alta velocidade.

Com o tempo, aquele carro ficou de lado e, acompanhando as corridas de Nélson Piquet, comecei a entender o que eram aquelas corridas e tive até a dimensão de quem foi Emerson Fittipaldi e o que era aquela Lotus.

Torci pelo Piquet. Mas me apaixonei mesmo pelas corridas. E com o tempo entendi como funcionava aquele negócio, a disputa dos pilotos e escuderias, o que era o jogo de equipe, quem eram os grandes ases e quais eram os grandes times. E com a aposentadoria de Nélson, deixei de ser um torcedor de pilotos e passei a querer assistir grandes corridas.

É claro que sempre se simpatiza com um ou outro, mas sempre olhei para os caras que ficavam atrás dos volantes sem me preocupar com o lugar onde tinham nascido. Nunca torci pelo Senna, por exemplo, apesar de apreciar seu arrojo.

Até que um dia apareceu um certo alemão que, com status de primeiro-piloto-praticamente-dono-da-ferrari, ao lado de Jean Todt e Ross Brawn, extrapolaram o conceito de jogo de equipe. O ápice foi o GP da Áustria de 2002, em que Rubens Barrichelo jogou a merda no ventilador ao quase parar seu carro a poucos metros da linha de chegada, permitindo a vitória do alemão. Foi um escândalo. E por conta disso, até novas regras foram criadas pela categoria.

2010 tem sido um ano especial na categoria. Apesar das dificuldades em se ultrapassar, pelas características de carros e pistas atuais, grandes duplas de equipes têm protagonizado disputas inesquecíveis, o caso de Vettel e Webber na Red Bull, Hamilton e Button na McLaren. E o mesmo se esperava de Alonso e Massa na Ferrari.

Até que o time italiano (Domenicalli à frente), o espanhol mimado e de caráter duvidoso, e o brasileiro fraco, sem atitude, sem hombridade, estragaram tudo.

Para mim, nos dois episódios, mais grave do que o jogo de equipe extremo foram as posturas dos dois brasileiros. Barrichelo expôs a farsa ao freiar quase na linha de chegada, mas depois se agarrou no discurso do “só um brasileirinho contra o mundo”. Massa, a despeito do que todo mundo viu e ouviu, primeiro fez cara de emburrado para depois dizer que foi uma decisão sua.

Não acho que a Fórmula 1 acabou ou vai acabar por causa disso. Assim como eu, milhões de pessoas continuam gostando das corridas. Mas episódios como o de domingo confirma a tese de que, mais do que um esporte, a F1 é um negócio. Um negócio que pode ser divertido para quem assiste.

Mas o que a Ferrari fez (de novo) pode sim espantar uma boa parcela de público, mesmo que temporariamente, que espera por disputas limpas e reais. Isso pode espantar patrocinadores que pagam as contas que garantem os carros na pista e tudo pode ficar muito mais difícil. Mas depois passa, como sempre.

E se você quer continuar ou começar a assistir corridas de F1, não esqueçam de não torcer por ninguém. Apenas apreciem o espetáculo. Porque da mesma maneira que nossa seleção não é a pátria de chuteiras, os pilotos brasileiros não são a pátria sobre rodas. Ou vão se decepcionar…

Foto do dia: bilder von der Formel 1

Enquanto espero pela convocação, aproveito a hora do almoço para ler um pouco. Fuça daqui e dali, passei pelo blog do Flavio Gomes e encontrei essa dica, devidamente incorporada à lista de links, na barra à direita, na seção Na pista. É um site de fotos alemão, com registro de todos os carros de F1, desde a pré-história da categoria. Pra quem gosta da categoria e é curioso com sua história, imperdível. De quebra, vale usar as fotos para ver como os carros evoluíram ao longo do tempo.

Para ilustrar, Emerson Fittipaldi e Ingo Hoffman, a bordo do Fittipaldi FD04, da Copersucar Fittipaldi, no Grande Prêmio do Oeste de 1976. Nesta época, aconteciam duas corridas por ano nos Estados Unidos, Leste e Oeste.

Deixem-no em paz

Se estivesse vivo, Senna teria completado 50 anos no último domingo. E como deixei pra falar do tema depois de passado, todo mundo já viu em todos os sites, portais, TVs, jornais e o diabo a quatro, especiais sobre o ídolo contando pela enésima vez as histórias da sua vida, de suas vitórias, suas poles, vários detalhes inéditos e tal e coisa.

Como já escrevi antes, descobri a F1 e me apaixonei por ela no início da década de 80, acompanhando o primeiro título de Nélson Piquet. Por causa disso, nenhum argumento técnico vai me convencer que houve carro mais bonito que a Brabham BT 49C. Claro que há menções honrosas para a Lotus 72 preta e dourada de Fittipaldi e a Matra azul que Jack Stewart pilotou em 1969.

Quando Senna chegou à F1, para um garoto que mal tinha ultrapassado a marca de dez anos de idade, era só mais um piloto brasileiro para quem torcer, até a lendária corrida de Mônaco, em que – a bordo da Toleman – apavorou o ‘professor’ Alain Prost pela primeira vez. Sem falar, claro, de outras corridas históricas por Lotus e McLaren.

Mas, acostumado com o constante ‘troféu limão’ de Piquet, por não ter papas na língua e nunca puxar o saco de jornalistas (principalmente da TV oficial), sempre me incomodou o jeito muito certinho do piloto, que pensava em cada vírgula de cada frase que falava. Me incomodava sua relação com a Globo, me incomodava o jeito marqueteiro de levantar bandeirinhas do Brasil a cada vitória, a história muito mal contada da sexta marcha em sua primeira vitória no Brasil.

É inegável que Senna foi um dos maiores pilotos de todos os tempos. Imbatível em voltas voadoras, conseguiu poles com carros que – nas mãos de pilotos comuns – provavelmente não largariam entre os seis primeiros, além de uma série de outras qualidades. Ninguém é tricampeão mundial de qualquer esporte se não for um sujeito especial.

Só que para definir alguém como o melhor de todos os tempos, principalmente em função da impossibilidade de comparação de tecnologias, épocas etc etc etc, só há dois critérios: números ou gosto pessoal. Pelo primeiro, Schumacher é imbatível. Pelo segundo… Nélson foi muito mais completo que Ayrton. E esse é apenas o meu ponto de vista, sem querer fazer qualquer provocação aos apaixonados (e muitas vezes xiitas) torcedores de Senna.

Se não tivesse morrido em 94, provavelmente conquistaria mais um ou dois títulos e Schumacher não teria os números que tem. Talvez se aposentasse após a quinta conquista, após ter igualado Fangio. Hoje seria, muito provavelmente, um empresário de sucesso, talvez ligado ao automobilismo.

Se não tivesse morrido em 94, da maneira que morreu, com imagens transmitidas para o mundo inteiro, dificilmente moveria ainda hoje as multidões. Provavelmente seria reconhecido como o grande campeão que foi, mas sem a histeria que sucedeu seu falecimento.

Não estou escrevendo nenhuma novidade, muita gente já falou sobre isso. Mas tentem, só por alguns momentos, imaginar como seria Senna sem o histrionismo de Galvão Bueno, sem a batida na Tamburello. Só por um minuto, imaginem como seria sua vida sem a melodramática memória daquelas manhãs de domingo, sem o tema da vitória executado em modo fúnebre de novela mexicana.

Não faz sentido dar parabéns a quem já está morto. E seria bom tê-lo visto correr mais um pouco. Mas ele já foi, como todos nós vamos um dia. Então é obrigação de todo mundo deixar o moço em paz enquanto continuamos por aqui.

Pouca gente lembra, mas naquele mesmo final de semana de 94, Rubens Barrichelo quase morreu na sexta-feira, ao decolar na variante Bassa e praticamente picotar sua Jordan na tela de proteção. Roland Ratzenberger morreu no sábado, ao encher o muro da curva Villeneuve com sua Sintek. Ayrton, no domingo. E é bem provável que a sua morte – a última de um piloto de F1 em treino ou corrida, um tricampeão morrendo ao vivo – tenha sido o grande legado de sua vida. Pois de lá pra cá, o investimento em segurança foi absurdo, tanto nos carros de corrida (de todas as categorias) quanto nos de rua.

Senna, Prost, Mansell e Piquet

Então, independente de qualquer coisa, sem responsabilizá-lo pela alegria de ser brasileiro, por continuar aproveitando as manhãs de domingo, sem lágrimas forçadas de crocodilo, a imagem que faço questão de guardar do sujeito é desta foto aí: um grande piloto que brilhou entre outros grandes pilotos.

Um homem de família

Antes de falar do que interessa, gostaria de agradecer à Light por mais uma falta de luz. Dessa vez, a desculpa foi a chuva. De outras o calor. Fiquemos esperando qual será a próxima. E graças a ela, o texto que ficou pronto no domingo à noite, só vai ao ar pela segunda de manhã. Por acaso, não é trabalho. Mas se fosse, quem, como e a que custo pagaria o prejuízo?

Enfim, foi impossível não fazer o mínimo de relação entre esse final de semana, o primeiro de Fórmula 1 do ano, e o filme estrelado por Nicolas Cage em 1999. Não vi qualquer treino, livre ou de classificação. Assisti à corrida, mas a família tra-la-lá já estava pronta pra sair de casa poucos minutos depois da bandeirada de chegada.

De certa forma, não é ruim esperar quase o dia inteiro para sentar e escrever com calma sobre a corrida, deu tempo de pensar em tudo o que aconteceu (e não aconteceu). Pra facilitar a vida de quem escreve e, quem sabe, da meia dúzia de três ou quatro amigos que passam por aqui, vamos por partes – como diria o Tião, açougueiro da esquina.

– Antes de falar da corrida, gostaria de saber quem foi o gênio que resolveu usar um pedaço de pista em que carros de Fórmula 1 não conseguem passar da segunda marcha. Se já não bastasse a falta de personalidade do circuito barenita, substituíram um trecho de velocidade razoável em que havia uma variante de média/alta por trocentas curvas de autorama. É mais ou menos como fazer os carros disputarem uma prova na Estrada do Joá. Só que sem graça, porque em vez da vista do mar e do ambiente da montanha, areia do deserto. Resumindo, uma corrida quase mixuruca em uma pista mequetrefe.

– O primeiro detalhe da prova não foi nenhuma surpresa: a confirmação do tal G4 que a pré-temporada apresentou. Ferrari, Red Bull, McLaren e Mercedes largaram e chegaram nas oito primeiras posições. E se os carros empurrados com motor Mercedes partiram um pouco atrás das outras duas em termos de performance, a Red Bull perdeu uma corrida praticamente ganha para a falta de confiabilidade do seu carro. Um problema no escapamento tirou potência de Vettel no último terço da prova. Italianos, brasileiros e espanhóis vestidos de vermelho agradeceram penhorados.

– Problemas da Red Bull à parte, Alonso ganhou a corrida na saída. Todo mundo achou estranho quando Massa torceu o nariz pelo segundo lugar no grid. E a largada foi didática. Do lado sujo da pista, tracionou mal e – tentando defender posição – acabou entrando nas primeiras curvas em situação desfavorável. Alonso levou a melhor. Sendo a Ferrari extremamente conservadora, dificilmente deixaria seus pilotos abrir uma briga direta por posições. Pra completar, Massa ainda foi obrigado a tirar o pé no final, por problemas de superaquecimento. Para o espanhol, o óbvio: com a vitória na estréia, muita confiança. A luta de Massa será inglória, mas a situação pode ser um dos pontos altos da temporada, porque o brasileiro mostrou que não restou nenhuma seqüela do acidente que o tirou da temporada passada.

– Entre as equipes que fariam parte do segundo grupo, algumas observações. Williams e Force India começam o campeonato brigando pelo quinto lugar entre os construtores e, por algumas circunstâncias de corrida, podem até se meter entre os oito carros mais fortes. Os indianos levam certa vantagem sobre os ingleses se olharmos para a temporada completa, pois têm uma parceria técnica com McLaren, motor Mercedes e mais grana para desenvolver o carro. Toro Rosso e Sauber foram uma grande decepção, principalmente a segunda, que teve seu brilhareco nos treinos coletivos espanhóis. E Renault parece estar melhor do que todos esperavam. Com o talento de Kubica e Petrov (que dadas as possibilidades, fazia uma grande corrida), pode fazer algumas surpresas, principalmente em pistas de baixa.

– Entre as novatas, nada além do esperado. O grande momento foi a fantástica largada de Lucas Di Grassi, um belo cartão de visitas. A Hispania fez pouco mais do que um shakedown, enquanto o time de Richard Branson mostrou as fragilidades de um projeto construído completamente no computador. De qualquer maneira, o carro tem algum potencial. O destaque do dia foi a Lotus, que conseguiu levar seus dois carros até o final.

– De maneira geral, a corrida foi modorrenta. Pela expectativa que havia, parece que foi muito melhor esperar pela festa do que participar dela. De qualquer maneira, as novidades farão bem ao campeonato. Mas é bom saber que mesmo que o número de ultrapassagens aumente, acontecerão muito mais por questões técnicas, como desgaste de pneus ou problemas de freio e motor, graças à nova dinâmica provocada pelo não reabastecimento. Como aconteceu hoje, quando as Ferrari e Hamilton deixaram Vettel pra trás. Se depender da aerodinâmica, nada mudará em relação aos últimos anos. Ainda mais com os pneus dianteiros mais estreitos. Entrar no vácuo, fazer curva embutido… Todas essas manobras de preparação para uma possível ultrapassagem tornam o carro indirigível.

– Da primeira corrida, valeu mesmo o acúmulo de informações que os times levarão para as próximas. As trocas de pneu prometidas a pouco mais de dois segundos não aconteceram. Os tempos devem até cair, mas nada assombroso. No patamar de hoje, entre 4 e 5 segundos, ainda não vale a pena correr o risco de fazer duas paradas em função do tempo total perdido. De quebra, a durabilidade dos pneus – mesmo os macios – não causou grandes perdas de rendimento.

– A próxima corrida acontece em duas semanas, no circuito de Albert Park, em Melbourne. Pista tradicional, muito mais divertida para pilotos e espectadores, meio autódromo, meio circuito de rua. Carros e pilotos não sofrerão com altíssimas temperaturas e areia. Pneus também devem sofrer menos, pois o asfalto é muito menos abrasivo. Se alguma equipe levar atualizações, devem se resumir às novas, principalmente peças mais resistentes na Virgin e qualquer coisa que possa, pelo menos, aproximar a Hispania das outras duas estreantes.

– Por fim, mais uma triste transmissão da Globo. O que é VRT? É como os profissionais da vênus platinada chamará a Virgin. Outra: apesar de ter Emerson Fittipaldi na cabine, e principalmente na hora de se despedir do bi-campeão, o narrador (ele mesmo…) falou muito mais que o convidado. Também tentaram fazer sentimentalismo barato com o Bruno Senna que, brilhantemente, não se deixou levar. No final, narrou o final da corrida uma volta antes do que devia. Triste é ver alguém como Reginaldo Leme preso a essa engrenagem.

– Também pode ser divertido para alguém (tem louco pra tudo) ouvir o Mania de Esporte da semana passada e comparar o que aconteceu na corrida e as previsões que foram feitas.

As fotos são do IG, Globo.com e do site oficial da Fórmula 1

O primeiro legado, o primeiro engodo

Uma das tragédias do Pan 2007 e, por conseqüência, dos jogos Rio 2016 é o entendimento que para realizar um evento e construir novas instalações esportivas o princípio de tudo é a destruição de uma outra praça esportiva. Apesar de não fazer o menor sentido, foi isso que aconteceu.

Para construir uma arena, um parque aquático e um velódromo, mutilaram um espaço de classe mundial, o Autódromo Nélson Piquet. Com a definição do Rio como sede olímpica, o pouco que sobrou da pista será destruída definitivamente.

Autódromo de Jacarepaguá em 1964. Nessa pista foram realizadas algumas edições dos 1.000 km da Guanabara.

Autódromo de Jacarepaguá em 1964. Nessa pista foram realizadas algumas edições dos 1.000 km da Guanabara.

Então, agradeçamos a Nuzman, César Maia, Eduardo Paes, Sergio Cabral, Lula etc etc etc (além da luxuosa colaboração da Confederação Brasileira de Automobilismo e sua completa falta de interesse e atuação).

É bom lembrar que Jacarepaguá viu provas de Fórmula 1, com vitórias de Nélson Piquet, o reinado de Alain Prost e um histórico segundo lugar de Emerson a bordo do Copersucar. A pista também recebeu a Moto GP e os cariocas se curvaram a Valentino Rossi. André Ribeiro foi outro brasileiro a brilhar no complexo, vencendo uma das poucas corridas da Indy que o Rio sediou. Além de boa parte da história do automobilismo nacional, é claro.

Ou seja, essa turma conseguiu destruir mais de 30 anos de história (claro que só estou me referindo ao autódromo moderno), um circuito misto apontado como dos melhores e mais seguros do mundo, um oval médio e original com duas freadas fortes e um kartódromo.

E aí, nosso fabuloso ex-prefeito (aquele que começou a destruição), em seu ex-blog, resolve fazer farofa e grita aos quatro ventos que é preciso construir um novo autódromo, que a justiça já decidiu por isso, que a CBA tem que fazer valer seus direitos etc etc etc.

Cacete, se acredita nisso tudo, porque cargas d’água deixou destruírem o autódromo? Ah tá, precisava aparecer de alguma maneira, está fora da mídia há muito tempo…

Bom, reza a lenda que um novo complexo será construído, de acordo com todas as exigências da FIA, e que permitirá ao Rio receber, novamente, a fórmula 1. E já dizem até que a pista será em Deodoro. E aqui há dois detalhes.

O primeiro é a distância do Centro e da zona sul, pontos de concentração de turistas. Vale lembrar que, no mundo inteiro, os autódromos não ficam em locais centrais, por várias razões, entre elas o barulho e o trânsito do público. E, pensando em Jacarepaguá, quando surgiu a primeira pista (na época das fotos em preto e branco) e mesmo quando foi construído o autódromo que recebeu a F1, aquele cantão não era (até hoje não é) muito habitado. Ou seja, por esse aspecto, Deodoro não seria um problema.

Mas aí, resolvi abrir o Google Maps e… Onde ficará o tal autódromo? Vão destruir a Vila Militar? Ou colocarão abaixo o Campo dos Afonsos? Vão desfazer o bairro e transferir sei lá quantas mil famílias para sei lá onde? Porque não há espaço!!! Dêem uma olhada na imagem abaixo. Estão tentando enganar quem?

Deodoro

Enfim, para todos aqueles que gostam de automobilismo, fica o recado: nunca mais teremos um autódromo no Rio, eis o primeiro legado combinado do Pan com as Olimpíadas. Gostaria muito de estar errado, torço mesmo para isso. Mas até que os primeiros carros partam para o primeiro treino de classificação da primeira corrida, o novo autódromo carioca não passa de ficção.

Muitas novas e mais especulações

 

Jim Clark

Jim Clark

Nas 37 temporadas da Fórmula 1, entre 1958 e 94, foram 491 corridas, 172 pódios, 107 pole positions, 79 vitórias, 71 melhores voltas, sete títulos de construtures e cinco pilotos campeões mundiais: Jim Clark (duas vezes), Graham Hill, Jochen Rindt (post mortem), Emerson Fittipaldi e Mario Andretti.

Pois a novidade do dia, que pegou todo mundo que acompanha a F1 de surpresa, é que a Lotus voltará a correr em 2010.

 

Graham Hill

Graham Hill

A nova Lotus (que não tem nada a ver com a antiga, é bom que se diga) vai ocupar a vaga da BMW Sauber, que anunciou sua retirada há poucas semanas. E nesse estranho mundo moderno onde ninguém é dono de mais nada e CEOs e conselhos de administração dirigem grupos de empresas absolutamente despersonalizadas, um consórcio de investidores (eu sou do tempo que consórcio era algo para quem queria comprar um carro) e o governo malaio fizeram a inscrição da equipe.

 

Jochen Rindt

Jochen Rindt

O chefe da equipe será Tony Fernandes (fundador e presidente do Tune Group que é dono da Air Ásia que patrocina a Williams) e o diretor-técnico será Mike Gascoyne, ex-Renault, Toyota e Force India (foi demitido no final de 2008). A sede da equipe será em Norfolk, próxima à Litespeed (time de F3 que se inscreveu e foi preterida no primeiro processo de escolhas da FIA, entre junho e julho), e cerca de 20km da fábrica original da Lotus. Sua base, onde o trabalho pesado será feito (projetos, pesquisa, desenvolvimento, fábrica e centro técnico), ficará no autódromo de Sepang e os carros usarão a configuração padrão da FIA: câmbio X-Trac e motores Cosworth.

 

Emerson Fittipaldi

Emerson Fittipaldi

Mas essa não é a única notícia do dia não. Ainda sobre carros e equipes, Max Mosley já avisou que vai pedir às 13 equipes escolhidas uma permissão para mudar as regras, permitindo a entrada de mais um time e o aumento do grid para 28 carros. Isso porque a BMW Sauber (ou seus espólios, digamos) foi comprada pela empresa suíça Qadbak Investments. Se tudo der certo, há possibilidades desse “novo” time usar motor Ferrari (antes de ser abraçada pela BMW, a Sauber era parceira dos italianos) ou, por que não, o mesmo Power train padrão oferecido às novas equipes.

 

Mario Andretti

Mario Andretti

Nessa notícia há um detalhe. É claro que a tal autorização para que tenhamos 14 equipes é necessária para evitar problemas futuros, mas as chances de termos 28 carros na primeira corrida de 2010 é mínima, tudo isso por causa do imbróglio Piquet-Briatore-Symonds-Renault.

A nova desta novela é que Max Mosley ofereceu a Pat Symonds o benefício da delação premiada, em função do seu primeiro depoimento, em que preferiu não responder as perguntas dos investigadores. Como não negou nada, os investigadores praticamente já confirmaram a veracidade da história de Nelsinho. Se aceitar, joga Briatore aos leões como único culpado de tudo. E mesmo que não aceite, dificilmente a Renault e os dois chefes do time sairão ilesos. Com esse cenário, quem pode garantir que a equipe francesa continuará na F1?

 

Pat Symonds

Pat Symonds

De quebra, novos rumores de uma possível desistência da Toyota voltaram a rondar o padock nos últimos dias. Querem mais? Já há muitas e muitas dúvidas sobre a capacidade das novatas escolhidas no meio do ano estarem prontas de verdade.

Quer dizer, em vez de 28 ou mesmo 26, há uma grande chance de termos apenas 24 ou 22 carros largando em 2010. É claro que a basca Épsilon Euskadi continua pronta para a F1, mas se as decisões demorarem muito a sair, não será possível construir os carros e preparar tudo o mais que envolve um time de fórmula 1.

Quem aposta em quê?

Interlagos (ou ‘preparem-se que a história é longa’)

Na primeira vez que fui a um autódromo, tinha 8 ou 9 anos, em 1981 ou 82. Jacarepaguá. Fui com meu pai, um garoto da escola que já não lembro o nome e seu pai. Chegamos de manhã cedo e a programação tinha cinco ou seis corridas. A última delas, a sensacional Opala Stock Car.

Depois desse dia, foram muitos e muitos anos sem pisar em qualquer autódromo, até a volta ao mesmo Jacarepaguá na primeira corrida da Fórmula Indy no Brasil. A partir daí, voltei a freqüentar (se é que 2 ou 3 vezes ao ano podem ser chamadas de ‘freqüência’) corridas de várias categorias e conheci os circuitos de Curitiba e Interlagos.

Com o anúncio de que Emerson e Piquet correriam na GT3 Brasil, me animei a ver uma das corridas. Nélson até hoje não estreou, mas resolvi insistir. Combinamos (eu, Zé Luis e Rodrigo) de irmos a São Paulo. Além dos super-carros (tem hífen?), Copa Clio e F3 Sul-Americana, que nunca tinha visto. Perfeito.

As categorias têm rodadas duplas aos sábados e domingos e optamos pelo domingo. Como a programação começava às 8 da manhã, teríamos que sair do Rio de madrugada, para chegar a tempo.

Cocares

Antes de contar nossa ‘aventura’, é preciso abrir parênteses. Numa analogia às estrelas com que são classificados hotéis no mundo inteiro, como poderiam medir os programas de índio? Em cocares! Pois então…

cocarDeveria ter desconfiado que as coisas não seriam exatamente como imaginamos logo no início. Alugamos um carro e fiz a reserva com uma semana de antecedência para não ter problemas. Pedi um Fox, carro 1.6 para agüentar bem a serra, com bom espaço interno (meço 1,90) e diária relativamente barata.

Na hora de retirar o bendito, a surpresa: não havia nenhum Fox disponível e o outro veículo oferecido na mesma categoria foi um Prisma 1.4. Quando reclamei, o rapaz que me entregou o carro disse que poderia trocá-lo em qualquer filial. Eram quase 22h. Quando falei que tinha feito reserva uma semana antes e pegaria a estrada às duas da matina, ele só pôde fazer cara de bunda… Sobre o motor, poucos problemas pois seríamos três sem bagagem. Mas acabei dirigindo quase mil quilômetros com a cabeça batendo no teto e os joelhos no volante. Parabéns à Localiza pela grande demonstração de respeito ao cliente e meus sinceros agradecimentos pelas dores no corpo.

Dutra

Eu e Zé saímos do Rio e pegamos o Rodrigo na rodoviária de Sampa, que partiu de BH. Junto com o carro, alugamos um GPS para andar em São Paulo, chegar e sair de Interlagos. Desperdício. Rodrigo, um mineiro que vive no Rio, é o próprio GPS de São Paulo, no que diz respeito aos caminhos que levam a Interlagos.

Partimos às duas da manhã e a programação foi perfeitamente cumprida. Sem trânsito e duas paradas rápidas, encontramos Rodrigo às 7h15 e fomos direto para o autódromo.

O primeiro susto foi o estacionamento. R$ 30 e, depois, ainda descobrimos que foi barato. Frio da porra na terra da garoa (ao menos para cariocas) e, ao invés de entrarmos logo, comemos um belíssimo e saudável sanduíche de lingüiça com Coca-Cola a título de café da manhã. Grande decisão, porque dentro do autódromo…

Ingressos

Durante mais de um mês, tentamos – de várias maneiras – conseguir credenciais para visitar os boxes. Afinal, se estávamos ali pela GT3, queríamos ver os carros de perto, se possível sem as tampas dos motores. Não conseguimos e resolvemos ir assim mesmo, de arquibancada (R$ 15). Havia um ingresso que dava direito a visitar os boxes, mas com preço absurdo: R$ 150. Gostaria mesmo de saber quantos foram vendidos na bilheteria, fora os dos patrocinadores e suas ações de marketing com clientes.

Mesmo com sol, o vento não deixou a gente tirar os casacos

Mesmo com sol, o vento não deixou a gente tirar os casacos

Perdemos o aquecimento da Clio mas entramos a tempo de ver a GT3 acordando. Sem compromisso e ritmo de corrida, é possível prestar atenção em alguns detalhes interessantes. O mais óbvio, a diferença entre os motores, com Lamborghinis quase em silêncio (para o que se espera de um carro de corrida, claro) e os Ford GT com o ronco ensurdecedor.

Ficamos no começo da reta, em frente ao início da faixa que delimita a entrada dos boxes, de onde podíamos ver o final da reta oposta, quase todo o miolo, junção e a reta, até a freada para o S do Senna. Não havia lugar melhor. Porque, para quem não conhece autódromos, é preciso explicar que em nenhum, em qualquer lugar do mundo, é possível enxergar toda a pista. O que chegava mais próximo disso era Jacarepaguá, aquele lá do início da história e que César Maia e Carlos Nuzman destruíram.

Corridas

A F3 começou às 9h30. Apesar do sol, a neblina denuncia o frio

A F3 começou às 9h30. Apesar do sol, a neblina denuncia o frio

A primeira corrida do dia foi da F3, com apenas 14 carros (chassis Dallara e motor Berta). Corrida razoável, com disputas interessantes, mas – depois de toques e abandonos – terminada por apenas 10 pilotos. Além disso, sul-americana apenas no nome, pois só há brasileiros na pista. Mas quem quer acompanhar a temporada, tem que se contentar com a transmissão via internet (pela RaceTV, não sei se ao vivo) ou os VTs no Speed Channel (canal 97, Net Rio).

A segunda prova foi a melhor do dia. Não esperava muito da Copa Clio, mas é impressionante como é divertida. 24 carros no grid, pista cheia e com muitas disputas e, ao contrário do que estamos acostumados a ver na Stock Car, muito esforço de todos para que não haja toques. É claro que há acidentes e batidas, mas as brigas por posições são impressionantemente limpas. Palmas para os pilotos.

Na largada da Clio é possível ver que o carro de segurança comanda os pelotão até o último momento, para que nada dê errado. Mais um exemplo para a Stock Car.

Na largada da Clio é possível ver que o carro de segurança comanda os pelotão até o último momento, para que nada dê errado. Mais um exemplo para a Stock Car.

Um detalhe que ajuda a melhorar a corrida é que, depois de um terço de prova, o safety car entra para reagrupar os pilotos. Os cinco primeiros nesse momento recebem pontos de bonificação e, depois que recomeça, novas disputas. Algo que vale a pena acompanhar durante todo o ano (a ESPN Brasil transmite).

Público

Verdade seja dita, para o que estamos acostumados a ver nos autódromos brasileiros, até que tinha bastante público presente. E é preciso lembrar que Stock e Truck, que estão sempre lotados (muito em função da farta distribuição de convites pelos patrocinadores), ao contrário de ser regra em corridas no Brasil, são enormes exceções.

A arquibancada quase vazia é a regra do automobilismo brasileiro

A arquibancada quase vazia é a regra do automobilismo brasileiro

Mas não dá para esperar muito público mesmo. Pouquíssima publicidade, mesmo na cidade onde acontece o evento. E nenhuma estrutura. Se não tivéssemos comido aquele sanduíche, teríamos ficado o dia inteiro à míngua. Dentro do autódromo, apenas uma barraquinha de comes e bebes (pouquíssima variedade) e, claro, uma fila absurda.

Além disso, apesar de grandes marcas envolvidas, nada para o público. Nenhum estande onde se pudesse comprar lembranças de qualquer tipo. Em resumo, nenhuma atração para o público nos intervalos entre as provas. O meu sentimento é que a organização se incomoda com a presença de torcedores e fazem de tudo para que ninguém volte.

Os carros

Andreas Matheis tocou Walter Salles depois de ser ultrapassado. Dick Vigarista?

Andreas Matheis tocou Walter Salles depois de ser ultrapassado. Dick Vigarista?

Enfim, a corrida que nos levou a Interlagos. Apenas 14 carros na pista, mas algo que relevamos pois são máquinas muito caras em apenas seu segundo ano no Brasil. E aí é que está o problema: grana. Nitidamente, todos pensam 30 vezes antes colocar o carro em uma disputa de verdade e a corrida acaba sendo meio morna, com raríssimas ultrapassagens. Além disso, o trabalho de equalização dos carros, feito na Europa e antes de começar o campeonato, falhou e os dois Ford GT sobram na turma. E sem fazer qualquer esforço.

No final da corrida, não vimos a única disputa real e que acabou decidindo a prova: os dois Ford se pegaram no S do Senna e acabaram se tocando. Um ficou fora, o outro se arrastou até terminar em quinto. Em resumo, os carros são lindos mas corridas e campeonato são muito sem graça. Muita coisa pode melhorar, se o grid encher e os carros forem realmente equilibrados. Por enquanto, resta torcer para 2009 ser melhor que este ano. E quem quiser ver de casa, ao vivo pela RaceTV ou os VTs na faixa Grid Motor do SporTV.

The End

Do autódromo, direto pra estrada. Almoço no caminho, muito trânsito, cinco pedágios e algumas obras depois, conseguimos entregar o carro às nove da noite e, finalmente, descansar. A conclusão é que corrida é muito bom do sofá (a não ser que os organizadores sejam realmente organizadores) e, talvez, uma vez por ano, desde que haja corridas no Rio. Viajar de novo, só pra isso, nem pensar.

E, afinal, gostaria que me ajudassem: quase 12 horas de estrada, 10 pedágios, arquiba sem comida e bebida, corridas sem graça e um frio da porra. Quantos cocares valem esse programa?

PS 1: é claro que, pra quem gosta, ver e ouvir os carros ao vivo, discutir automobilismo entre amigos que realmente gostam e entendem e (mal ou bem) ter história pra contar, vale muito.

PS 2: além dos três originais, Marcos Lobo foi nos encontrar na pista, o que foi excelente. Matar a saudade de um amigo que, pela distância, é raro encontrar, não tem preço. Beijo na Zélia e nas crianças.

PS 3: é terrível chegar a Interlagos, ver os restos do circuito original e não ficar triste. Não dá para entender como foi possível atualizar o autódromo sem manter o circuito original como uma pista alternativa, por exemplo, para provas longas. Vale lembrar que um dos consultores técnicos do projeto foi Ayrton Senna.

PS 4: Que inveja… São Paulo ainda tem autódromo.

PS 5 (18h34): Fui corrigido nos comentários sobre os motores da F3. Esse é outro detalhe: ao chegar no autódromo, não existe qualquer tipo de informação sobre o que vai acontecer. Ao comprar ingresso, não deveríamos receber um folder com informações sobre as categorias, pilotos etc.?